
Sentei-me ao lado dele, um homem bom, descrito como bom pai e bom marido. Tentei olhar dentro de seus olhos, foi impossível, a cabeça baixa impediu o contato visual. Quis entender aquela dor dilacerante a sufocar sua alma. Não havia como isso acontecer. A dor é só dele, sem palavras para dimensionar, nenhum dicionário traduziria.
Secou as lágrimas, pareceu-me sentir vergonha de chorar, homem feito que é. Disse-lhe para soltar o choro engasgado, sentimento retido aprofunda ainda mais a dor. Estávamos ali para estender as mãos e não para julgar, como infelizmente o faz a maioria diante de tal situação.
Um triste e imenso vazio era a única percepção daquele instante. A busca pelo sentido da vida, quase finalizada numa decisão fatal.
A voz mal se fazia ouvir, sem forças para continuar lutando, era como um vaso desenhado pelo mais talentoso artesão, belo por fora, seco por dentro. Lembrou-me das Bodas de Caná, ocasião na qual falta vinho na festa de casamento e Maria de Nazaré pede ajuda a Jesus.
Logo veio a célebre frase: “Você precisa se ajudar, meu amigo”. Agora, passado o fato, penso: quanta bobagem no meu conselho. Em situações extremas, ao que pude testemunhar, ajudar a si mesmo não é uma possibilidade. O sujeito da ação só quer mesmo é deixar de existir.
Segui jorrando palavras próprias de um ser acéfalo: “Depende de você!”. Mais uma tolice provinda do desconhecimento sobre a alma humana! Revela-se a mim, agora, mente reflexiva, que no instante em que a vida deixa de fazer sentido, o indivíduo não tem condição de agir por si mesmo em busca de uma saída.
Então, o que dizer? Como agir diante de uma condição extrema? Qual escola nos ensina a compreender a dor do outro? Em que livro achamos a receita com os ingredientes certos para encarar a situação?
Silêncio! Não há resposta pronta. Não é bolo de cenoura com calda de chocolate cuja descrição só precisa ‘dar um Google’.
Refletindo sobre aqueles olhos tristes, aquela dor calcinante, e a decisão quase transformada em fim, do ponto de vista material, pois que o Espírito é imortal, percebo que a ação correta é apenas segurar as mãos dele, já sem forças, colocar no colo e levar a caminhar com as nossas pernas até a esperança ser renovada e ele volte a andar sozinho.
Ofereci ajuda, mesmo diante da minha incapacidade. Mais uma vez lembrei o Mestre, o grande médico das almas, e todo o equipamento ofertado no mundo para a cura individual do ser.
Primeiro passo, buscar a ajuda correta, um profissional especializado em saúde mental. Daí por diante, os próximos passos podem ficar mais fáceis, ou menos difíceis.
Para o momento imediato, o principal é fazê-lo saber: não está sozinho nessa luta, há muitas mãos estendidas prontas para abraçá-lo sem julgamentos, apenas amor.
Ouviu de bocas outras, mais importantes que a minha para sua vida, o quanto é amado e importante, o quanto sua vida importa para estes que o amam. Me fez entender que não é sobre ter, nem sobre propósitos, menos ainda sobre fé, é somente sobre uma dor a esmagar a alma, sem explicação prática.
Ergueu a cabeça, seguirá adiante, acompanhado da mais bela presença, o amor.
Por Nice Almeida

